As redes sociais e a história do tempo presente
A história sempre tem como preocupação o passado ou o futuro, nunca o presente. O motivo é simples: em ambos os casos é possível definir uma lei, uma ordem, fazer uma previsão dos acontecimentos, de como eles foram ou de como eles tendem a ser. No presente, isto não é possível, pois à medida em que o olhar da história se dirige para os instantes do tempo presente, ela se perde nos acontecimentos produzidos a cada instante por bilhões de pessoas que não serão lembradas nas narrações dos vencedores e vencidos da história.
A história do autômato turco que joga xadrez contada por Walter Benjamin em seu texto Sobre o conceito de história, demonstra muito bem o que é a perspectiva histórica seja em relação ao passado e o futuro, sempre a cada lance revendo os lances passados e prevendo a próxima jogada. Se é num tempo presente que os lances históricos acontecem o que importa é a vitória no final do jogo e a história que será lembrada e contada por vencedores e vencidos, cabendo sempre aos últimos lembrar as perdas que tiveram para um dia, quem sabe, ganhar alguma vez de seu oponente. Ou mesmo acabar com a lógica histórica de vencedores e vencidos, o materialismo histórico.
Fugir às armadilhas do tempo presente sempre foi a perspectiva histórica do ser humano, seja esta fuga produzida pela redenção de um tempo passado ou pela salvação de um tempo futuro, ou ainda, pelo apelo de uma em relação a outra, de uma salvação futura como redenção do passado humano, um acerto de contas no fim da história entre vencidos e vencedores. Porém, o que a história do autômato contada por Benjamin nos mostra também é que a tecnologia nos aproxima cada vez mais do presente, de um presente que se faz a cada lance e contralance como no jogo de xadrez. Isto porque no jogo de xadrez, o que importa é o tempo presente e o que cada ser humano faz em cada lance e contralance. É possível perceber o que aconteceu e o que vai acontecer no jogo, mas tudo depende do lance e contralance de cada jogador que muda a história do jogo a cada momento, seja em relação ao passado, seja em relação ao futuro, e somente num determinado momento do jogo se pode perceber se será um vencedor ou vencido no fim do jogo. Fim do jogo no xadrez que é o momento em que o ser humano não tem mais saída, nenhum lance possível pode lhe salvar ou lhe redimir do destino que lhe é inevitável, a derrota, a morte, o xeque-mate, o fim da história.
O fato de se saber que na história do autômato é um anão jogador de xadrez que se esconde por debaixo da mesa movendo os braços do autômato, isto demonstra não simplesmente uma mostra uma utilização das tecnologias pelos seres humanos tendo em vista o mal, sempre possível na realidade. Mas, por um lado, a capacidade do ser humano em utilizar a tecnologia para alcançar os fins que deseja, por outro lado, a capacidade dos seres humanos em se enganarem pensando que interagem com tecnologias quando, na verdade, estão interagindo com seres humanos que as inventaram ou as utilizam para seus próprios fins. O autômato turco que joga xadrez, neste caso, é a imagem mais atual da utilização das tecnologias na modernidade pelos seres humanos, seja ao se esconderem cada vez mais por trás de tecnologias na tentativa de superar os seus adversários em rede seja se enganando com estas tecnologias como se elas fossem seus próprios adversários, os quais devem superar ou mesmo destruir.
As redes sociais, quaisquer que sejam elas, deste ponto de vista são o tabuleiro de xadrez no qual os seres humanos se colocam atualmente com seus lances e contralances, no caso, curtidas, comentários e compartilhamentos ou quaisquer que sejam os nomes dados para a interação dos seres humanos por meios delas e das tecnologias que utilizam para interagirem. Desse ponto de vista é uma outra perspectiva que se coloca na história em relação ao tempo presente na medida em que consideramos as redes sociais com seus bilhões de lances e contralances a cada instante, cuja lei, ordem passadas e previsão futura da história é quase impossível de um modo geral. As redes sociais atuais e futuras, assim como as tecnologias passadas, são os tabuleiros da história atual nos quais os seres humanos se põem de um lado como anões que sobem nos ombros de gigantes tecnologias querendo ser melhores do que outros, como pensava Bernado de Chartres na Idade Média, e de outro lado como seres humanos que utilizam as tecnologias sem saber que há seres humanos por trás delas, não por menos também querendo ser melhores que as tecnologias que foram construídas para vencê-los.
O que acontece tanto nas redes sociais como no tabuleiro de xadrez é que eles nos lançam numa absorção do tempo presente. Ficamos absortos na perspectiva dos lances e contralances que a cada momento criam e recriam a história da partida, de nossa própria existência no jogo como possíveis vencedores ou vencidos. Porém, se perdemo-nos e nos encontramos a cada lance e contralance (curtida, comentário, compartilhamento) na esperança de que no fim da história sejamos vencedores e não vencidos (fiquemos alegres ou tristes), o que importa é senão o tempo presente no qual vivemos a intensidade do momento ao ponto de que a cada partida terminada ficarmos com a expectativa de recomeçá-la ou mesmo queremos que ela nunca acabe. E, deste modo, ficamos completamente absortos na história do tempo presente em seu jogo interminável de lances e contralances e suas curtidas, comentários e compartilhamentos.
A sensação de perda e ganho a cada lance e contralance no tempo presente seja no jogo de tabuleiro seja nas redes sociais é inevitável. Assim como é inevitável a percepção de que a história do tempo presente a cada momento faz os seres humanos se deterem cada vez mais nos fragmentos da história do tempo presente que cada lance produz. Por sua vez não importam mais o passado e o futuro, apenas o instante em sua fugacidade momentânea a cada lance e contralance curtido, comentado, compartilhado.
O que se tem a partir de agora não é mais uma compreensão da história em sua linearidade, com início, meio e fim, isto é, passado, presente e futuro, mas uma negação dela totalmente, uma ausência de perspectiva histórica na medida em que o ser humano se torna cada vez mais absorto no tempo presente. Esta ausência de perspectiva história pode ser percebida na medida em que se olha para os bilhões de curtidas, comentários e compartilhamentos produzidos pelos seres humanos nas redes sociais, cada um deles produzindo um acontecimento a produzir uma história diferente, pessoal, mas não por menos social como acontece fora das redes sociais. Deste ponto de vista, a tarefa do historiador do presente é muito mais difícil, senão impossível, na medida em que colidir os bilhões de curtidas, comentários e compartilhamentos presentes nas redes sociais para lhe dar uma linearidade na perspectiva de um início, meio e fim necessário para se narrar uma história é extremamente difícil, ou mesmo impossível.
A cada vez que as redes sociais direcionam mais o nosso olhar para o tempo presente nos perdemos na história deste tempo que produzimos sem saber o que estamos produzindo. Nesta perspectiva histórica do tempo presente somos entregues à produção da história tal como os trabalhadores à produção nas antigas fábricas ao ponto de termos como única preocupação apertarmos botões sem saber no fim da história o que estamos produzindo. E assim como o Chaplin no filme Tempos Modernos somos engolidos por máquinas que na história do tempo presente são as redes sociais.
Não importa quem esteja nas redes sociais, se anões conscientes das tecnologias que utilizam ou pessoas inconscientes em seu desejo maquínico diante de tecnologias sem saber que por trás há seres humanos, elas são lançadas a uma mesma ausência de perspectiva da história a cada lance e contralance que dão nas redes sociais quando curtem, comentam ou compartilham algo. Nesta ausência de perspectiva da história do tempo presente e ao fim da história que as redes sociais lançam os seres humanos, conscientes ou não, mesmo que, paradoxalmente, queiram negar este fim, tornando a história interminável a cada instante vivido ou revivido nas linhas de tempo intermináveis construídas nas redes sociais. Neste sentido, se ao olhar para o passado e o futuro da história os seres humanos negam o presente e um fim da história aparece em cada previsão do que vai acontecer, que é o que aconteceu muitas vezes no passado, previsto pelo passado como lei, divina ou humana, a diferença é que ao olhar para o presente da história, ao contrário, eles não percebem o fim da história, mesmo que ele se ponha diante deles inevitável como o destino.
A moral da história do autômato que joga xadrez ou daqueles que usam as redes sociais, aquela que aparece senão no fim da história, é a de que os seres humanos, ao contrário do que pensam e mesmo que não pensem, são os autômatos que jogam xadrez na história do tempo presente manipulados pelas tecnologias das redes sociais que utilizam consciente ou inconscientemente e, por meio delas, alcançam uma felicidade. Felicidade que, neste caso, é a que Benjamin interpretou em relação às palavras de Lotze e ao tempo presente logo após a história do autômato em Sobre o conceito de história, uma felicidade de estar completamente absorto no tempo presente quando:
A história do autômato turco que joga xadrez contada por Walter Benjamin em seu texto Sobre o conceito de história, demonstra muito bem o que é a perspectiva histórica seja em relação ao passado e o futuro, sempre a cada lance revendo os lances passados e prevendo a próxima jogada. Se é num tempo presente que os lances históricos acontecem o que importa é a vitória no final do jogo e a história que será lembrada e contada por vencedores e vencidos, cabendo sempre aos últimos lembrar as perdas que tiveram para um dia, quem sabe, ganhar alguma vez de seu oponente. Ou mesmo acabar com a lógica histórica de vencedores e vencidos, o materialismo histórico.
Fugir às armadilhas do tempo presente sempre foi a perspectiva histórica do ser humano, seja esta fuga produzida pela redenção de um tempo passado ou pela salvação de um tempo futuro, ou ainda, pelo apelo de uma em relação a outra, de uma salvação futura como redenção do passado humano, um acerto de contas no fim da história entre vencidos e vencedores. Porém, o que a história do autômato contada por Benjamin nos mostra também é que a tecnologia nos aproxima cada vez mais do presente, de um presente que se faz a cada lance e contralance como no jogo de xadrez. Isto porque no jogo de xadrez, o que importa é o tempo presente e o que cada ser humano faz em cada lance e contralance. É possível perceber o que aconteceu e o que vai acontecer no jogo, mas tudo depende do lance e contralance de cada jogador que muda a história do jogo a cada momento, seja em relação ao passado, seja em relação ao futuro, e somente num determinado momento do jogo se pode perceber se será um vencedor ou vencido no fim do jogo. Fim do jogo no xadrez que é o momento em que o ser humano não tem mais saída, nenhum lance possível pode lhe salvar ou lhe redimir do destino que lhe é inevitável, a derrota, a morte, o xeque-mate, o fim da história.
O fato de se saber que na história do autômato é um anão jogador de xadrez que se esconde por debaixo da mesa movendo os braços do autômato, isto demonstra não simplesmente uma mostra uma utilização das tecnologias pelos seres humanos tendo em vista o mal, sempre possível na realidade. Mas, por um lado, a capacidade do ser humano em utilizar a tecnologia para alcançar os fins que deseja, por outro lado, a capacidade dos seres humanos em se enganarem pensando que interagem com tecnologias quando, na verdade, estão interagindo com seres humanos que as inventaram ou as utilizam para seus próprios fins. O autômato turco que joga xadrez, neste caso, é a imagem mais atual da utilização das tecnologias na modernidade pelos seres humanos, seja ao se esconderem cada vez mais por trás de tecnologias na tentativa de superar os seus adversários em rede seja se enganando com estas tecnologias como se elas fossem seus próprios adversários, os quais devem superar ou mesmo destruir.
As redes sociais, quaisquer que sejam elas, deste ponto de vista são o tabuleiro de xadrez no qual os seres humanos se colocam atualmente com seus lances e contralances, no caso, curtidas, comentários e compartilhamentos ou quaisquer que sejam os nomes dados para a interação dos seres humanos por meios delas e das tecnologias que utilizam para interagirem. Desse ponto de vista é uma outra perspectiva que se coloca na história em relação ao tempo presente na medida em que consideramos as redes sociais com seus bilhões de lances e contralances a cada instante, cuja lei, ordem passadas e previsão futura da história é quase impossível de um modo geral. As redes sociais atuais e futuras, assim como as tecnologias passadas, são os tabuleiros da história atual nos quais os seres humanos se põem de um lado como anões que sobem nos ombros de gigantes tecnologias querendo ser melhores do que outros, como pensava Bernado de Chartres na Idade Média, e de outro lado como seres humanos que utilizam as tecnologias sem saber que há seres humanos por trás delas, não por menos também querendo ser melhores que as tecnologias que foram construídas para vencê-los.
O que acontece tanto nas redes sociais como no tabuleiro de xadrez é que eles nos lançam numa absorção do tempo presente. Ficamos absortos na perspectiva dos lances e contralances que a cada momento criam e recriam a história da partida, de nossa própria existência no jogo como possíveis vencedores ou vencidos. Porém, se perdemo-nos e nos encontramos a cada lance e contralance (curtida, comentário, compartilhamento) na esperança de que no fim da história sejamos vencedores e não vencidos (fiquemos alegres ou tristes), o que importa é senão o tempo presente no qual vivemos a intensidade do momento ao ponto de que a cada partida terminada ficarmos com a expectativa de recomeçá-la ou mesmo queremos que ela nunca acabe. E, deste modo, ficamos completamente absortos na história do tempo presente em seu jogo interminável de lances e contralances e suas curtidas, comentários e compartilhamentos.
A sensação de perda e ganho a cada lance e contralance no tempo presente seja no jogo de tabuleiro seja nas redes sociais é inevitável. Assim como é inevitável a percepção de que a história do tempo presente a cada momento faz os seres humanos se deterem cada vez mais nos fragmentos da história do tempo presente que cada lance produz. Por sua vez não importam mais o passado e o futuro, apenas o instante em sua fugacidade momentânea a cada lance e contralance curtido, comentado, compartilhado.
O que se tem a partir de agora não é mais uma compreensão da história em sua linearidade, com início, meio e fim, isto é, passado, presente e futuro, mas uma negação dela totalmente, uma ausência de perspectiva histórica na medida em que o ser humano se torna cada vez mais absorto no tempo presente. Esta ausência de perspectiva história pode ser percebida na medida em que se olha para os bilhões de curtidas, comentários e compartilhamentos produzidos pelos seres humanos nas redes sociais, cada um deles produzindo um acontecimento a produzir uma história diferente, pessoal, mas não por menos social como acontece fora das redes sociais. Deste ponto de vista, a tarefa do historiador do presente é muito mais difícil, senão impossível, na medida em que colidir os bilhões de curtidas, comentários e compartilhamentos presentes nas redes sociais para lhe dar uma linearidade na perspectiva de um início, meio e fim necessário para se narrar uma história é extremamente difícil, ou mesmo impossível.
A cada vez que as redes sociais direcionam mais o nosso olhar para o tempo presente nos perdemos na história deste tempo que produzimos sem saber o que estamos produzindo. Nesta perspectiva histórica do tempo presente somos entregues à produção da história tal como os trabalhadores à produção nas antigas fábricas ao ponto de termos como única preocupação apertarmos botões sem saber no fim da história o que estamos produzindo. E assim como o Chaplin no filme Tempos Modernos somos engolidos por máquinas que na história do tempo presente são as redes sociais.
Não importa quem esteja nas redes sociais, se anões conscientes das tecnologias que utilizam ou pessoas inconscientes em seu desejo maquínico diante de tecnologias sem saber que por trás há seres humanos, elas são lançadas a uma mesma ausência de perspectiva da história a cada lance e contralance que dão nas redes sociais quando curtem, comentam ou compartilham algo. Nesta ausência de perspectiva da história do tempo presente e ao fim da história que as redes sociais lançam os seres humanos, conscientes ou não, mesmo que, paradoxalmente, queiram negar este fim, tornando a história interminável a cada instante vivido ou revivido nas linhas de tempo intermináveis construídas nas redes sociais. Neste sentido, se ao olhar para o passado e o futuro da história os seres humanos negam o presente e um fim da história aparece em cada previsão do que vai acontecer, que é o que aconteceu muitas vezes no passado, previsto pelo passado como lei, divina ou humana, a diferença é que ao olhar para o presente da história, ao contrário, eles não percebem o fim da história, mesmo que ele se ponha diante deles inevitável como o destino.
A moral da história do autômato que joga xadrez ou daqueles que usam as redes sociais, aquela que aparece senão no fim da história, é a de que os seres humanos, ao contrário do que pensam e mesmo que não pensem, são os autômatos que jogam xadrez na história do tempo presente manipulados pelas tecnologias das redes sociais que utilizam consciente ou inconscientemente e, por meio delas, alcançam uma felicidade. Felicidade que, neste caso, é a que Benjamin interpretou em relação às palavras de Lotze e ao tempo presente logo após a história do autômato em Sobre o conceito de história, uma felicidade de estar completamente absorto no tempo presente quando:
'Entre os atributos mais surpreendentes da alma humana', diz Lotze, 'está, ao lado de tanto egoísmo individual, uma ausência geral de inveja de cada presente com relação a seu futuro.' [O que, diz Benjamin] Essa reflexão conduz-nos a pensar que nossa imagem de felicidade é totalmente marcada pela época que nos foi atribuída pelo curso da nossa existência. [senão no tempo presente.]Diante das redes sociais que produzem uma felicidade da história do tempo presente, talvez se pense que o melhor seja viver alheio a elas buscando uma felicidade numa salvação futura ou redenção do passado de modo messiânico. Contudo, enquanto a salvação ou redenção não chegam, e não é possível viver alheio ao tempo presente da existência, a felicidade seja fazer o que Schiller indicou a cada ser humano em sua existência como jovem amigo da verdade e da beleza em sua obra A educação estética do homem numa série de Cartas ao dizer: "Vive com teu século, mas não sejas tua criatura..." Uma felicidade que cada ser humano encontra em cada momento da existência na história do tempo presente sem perder de vista o que há para além de sua existência nesta história, no passado e no futuro, e, assim, não ser um ser humano autômato na história e sim, autônomo da história.
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