Como fazer uma tese
Na parte IV de sua Introdução da CrÃtica da razão pura (1781), o filósofo Immanuel Kant distinguiu brevemente num parágrafo duas possibilidades de juÃzos, o analÃtico e o sintético, que são duas possibilidades de entendimento, ou ainda, duas possibilidades de conhecimento, sobretudo, duas possibilidades de conhecimento do próprio conhecimento. Ao ler livros e artigos acadêmicos, não deixo de perceber como este único parágrafo de Kant ainda serve de crÃtica há muitos que defendem teses e mais teses em seus textos acadêmicos, mas também como serve de crÃtica há muitos comentários de pessoas em redes sociais em que pretendem emitir opinião fundamentada numa realidade e que me fazem doer os tÃmpanos com a total ausência de crÃtica neles. É como voltar a viver e conhecer antes de Kant, à s voltas com uma razão pura inquestionável, seja porque tenha uma relação ainda com uma metafÃsica religiosa cristã, mas também porque para muitos não faz mais sentido questionar o sentido do conhecimento como fez Kant com sua crÃtica em relação ao conhecimento que viera antes dele, seja em seu sentido racionalista, seja em relação à experiência, empirista, no caso, a partir da qual ele estabelece uma revolução copernicana.
Não por acaso, a publicação desta obra de Kant foi denominada de revolução copernicana por tudo que produziu em relação à compreensão do conhecimento, porém, esta revolução não lhe diz propriamente respeito, mas começa bem antes dele com Francis Bacon com sua crÃtica aos Ãdolos do teatro e, principalmente, com David Hume em sua crÃtica à tradição racionalista. Mas como toda crÃtica, o alcance da de Kant vai até o onde se propaga a crÃtica de seus detratores, neste caso, os do idealismo alemão representado em sua máxima expressão por Hegel, cujo absolutismo defendido fará a razão pura retornar ao pensamento filosófico pré-kantiano, agora despojada aparentemente de uma metafÃsica religiosa cristã, e a qual servirá para muitos de crÃtica a Kant, que talvez se perguntasse debaixo de seu lençol de terra em paz perpétua: Mas que juÃzos sintéticos Hegel produziu com sua Ideia, seu espÃrito, seu absoluto? Uma pergunta de Kant faria a Hegel e seus crÃticos hegelianos, mas que se pode lançar inevitavelmente a todos aqueles que pretendem conhecer em qualquer área de conhecimento tomando como fundamento a experiência e não a especulação, e aquilo que se coloca como germe nesta experiência e que é o fundamento de toda a modernidade, isto é, o novo.
A crÃtica de Kant no parágrafo em que descreve as possibilidades dos juÃzos analÃticos e sintéticos resume toda sua crÃtica da razão pura e ainda hoje ela ainda pode se colocar não apenas em relação a Hegel, mas também ao se ler livros e artigos acadêmicos, textos que defendem teses de todos aqueles que fazem ou fizeram parte de uma universidade, mas também ao se ler a profusão de comentários em qualquer lugar da Internet no qual se defende uma tese. Não por acaso, o tÃtulo deste texto lembra um outro livro, o de Umberto Eco, uma bÃblia para todos aqueles que procuram fazer suas teses na universidades acreditando ainda numa razão pura ao encher páginas e páginas com referências bibliográficas e citações de autores nos quais não se detieram num mÃnimo de pensamento crÃtico, tal como formulado por Kant no que diz respeito à s duas possibilidades de conhecimento, a analÃtica e a sintética. E muitas vezes propagando sobre a realidade juÃzos analÃticos como se fossem juÃzos sintéticos, isto é, sem acrescentar nada de novo à realidade, ao autor, nem ao conhecimento dela por um autor ou por si mesmos, apenas demonstrando sua razão pura para bancas mais puras ainda em seu conhecimento.
A crÃtica de Kant em relação ao conhecimento a partir das possibilidades do juÃzo analÃtico e sintético é simples como se pode perceber no parágrafo referido em questão. Nele Kant diz:
Talvez muitos se perguntem: que diabo é isso? E a resposta é simples: predicado é tudo que você diz sobre um sujeito, que identifica um sujeito, diz que é o sujeito, ou ainda, tudo que se diz sobre qualquer coisa como em "A casa é amarela." Neste sentido, segundo Kant, se tudo que se diz de um sujeito é algo que ele é, porque ele contém ou possui aquilo, mesmo sem saber, como algo oculto, isto é apenas uma análise que se faz do sujeito, mas que não lhe acrescenta nada de novo. Como no caso da casa amarela quando alguém diz à outra pessoa em frente à casa que a casa é amarela e a pessoa que escuta isto olhando para a casa amarela pensa e diz kantianamente de modo inconsciente: Sim, e daÃ? E daà que isto é um conhecimento analÃtico da casa que nada lhe acrescenta de novo é apenas uma afirmação do que a casa é na realidade e ninguém em sã consciência diante dela negaria isto, mas tão pouco se entusiasmaria também ao ouvir isto ao ponto de dizer: Oh, a casa é amarela! Que maravilha! Eu não sabia! Ou ainda, se perguntar, por que a casa é amarela? Por que pintaram ela de amarela e não rosa, ou não fizeram ela de vidro? De vidro?...
Não há, portanto, nada de novo ao se dizer a casa é amarela diante de uma casa amarela, nenhuma ampliação do conhecimento, pois se sabe o que é uma casa e e que amarelo é uma cor e que juntar o sujeito "casa" com o predicado "amarelo" num juÃzo analÃtico, a casa é amarela, não produz nenhuma ampliação do conhecimento. Portanto, aceitando a crÃtica de Kant e que é uma exigência em defesas na universidade, mas que se pode estender à vida, isto não passa de um conhecimento puro, isto é, em que não há crÃtica alguma nele nem tão pouco suscita uma. CrÃtica que somente é possÃvel quando se faz um juÃzo sintético, como na casa de vidro de Corbisier que muitos poderiam considerar impossÃvel de se pensar quanto mais em morar nela, mas cujo ideia, nem um pouco absoluta, e sim, crÃtica, faz justamente aquilo que Kant pressupôs em relação aos juÃzos sintéticos, que eles ampliem o conhecimento ao ponto de se pensar em relação a uma coisa algo que não se pensaria em relação a ela, como diz Kant criticamente em relação à s duas possibilidades dos juÃzos e do conhecimento ainda no parágrafo em questão:
Pensar algo que não fora pensado antes, pensar algo que não estava presente antes no que era pensado, pensar algo que não se identifica com aquilo que era pensado antes, eis toda a crÃtica da razão pura de Kant ao conhecimento não apenas a priori a Kant, mas também a posteriori a ele. Pensar deste modo, diz ele claramente na primeira frase depois deste parágrafo, é pensar a partir da experiência, pois, "JuÃzos de experiência como tais são todos sintéticos. (Grifos dele.)" Pensar a partir da experiência, pode-se dizer a partir dele, é pensar a partir de algo novo que é experimentado ou vivenciado naquele momento e que ninguém experimentou ou vivenciou ainda, pois é algo que acontece num determinado espaço e tempo, que se são ainda para Kant condições a priori do entendimento, não por menos o conhecimento não se restringe a estas condições requerendo ele sempre um a posteriori a elas, isto é, conhecer o que acontece na medida em que se experimenta algo no espaço e tempo, algo no caso que não se experimentara antes no espaço e tempo do pensamento ou mesmo da vida. Um conhecimento que falta há muitos hoje em suas experiências de uma vida cotidiana e em suas teses sobre ela sem se preocuparem com a ampliação, seja de sua vida cotidiana, seja de um conhecimento sobre ela em relação a algo novo, não como uma novidade ou moda, mas novo em relação à sua vida que se renova ao experimentar algo que não experimentara antes, ampliando uma compreensão dela para além do que ela é em sua identidade corriqueira.
A devastidão (esta palavra é um neologismo em relação à palavra devastação) que a crÃtica de Kant produz é, deste modo, negativa como ele diz, e tem de ser, pode-se dizer, pois não há crÃtica positiva, a não ser a crÃtica de um juÃzo analÃtico que nada diz de novo sobre algo e é apenas um elogio. Mas se a negatividade da crÃtica kantiana devasta de algum modo um sujeito, tão pouco ela produz uma devastação em relação a ele, isto é, uma destruição absoluta do conhecimento dele como o faz a Ideia de um conhecimento ou espÃrito que o faz considerar o sujeito ele mesmo como absoluto historicamente. Pois o que Kant quer com sua crÃtica é que:
De fato, que ganho notável se todos pudessem ser crÃticos em relação ao conhecimento, sabendo até que ponto um conhecimento não passa de especulação de um juÃzo analÃtico doutrinário em vez de ciência de um juÃzo sintético crÃtico que reconhece os limites do conhecimento sobre algo e tenta expandi-lo com algo novo, impensado ainda, promovendo não por menos algo diferente com sua crÃtica, mesmo que isto negue algo pensado em tese antes. Neste sentido, se todos pensassem como Kant que mesmo tendo produzido uma revolução no conhecimento não vê em sua crÃtica nenhuma ampliação, isto é, nenhum juÃzo sintético, nada de novo além do horizonte, mas sabendo que isto era senão útil para ampliar o limite do conhecimento humano sobre si mesmo e sobre tudo para além do que ele próprio imaginaria em seu horizonte. E, deste modo, não caindo no erro como quer Kant que é senão o de muitos que o criticam, que é de pensar que ele pretenda com sua crÃtica ou que sua crÃtica faz é limitar o conhecimento do ponto de vista de sua razão a um sujeito individual em detrimento de um sujeito histórico, quando, pelo contrário, o que faz é elevar o sujeito individual racional ao conhecimento de si mesmo como pura especulação doutrinária andando em cÃrculos ou em retas perfeitas em sua infinitude histórica e fazer com que critique a si mesmo em sua razão individual, quebrando os cÃrculos e retas perfeitas históricas que o aprisionam ad infintinum num absoluto, ainda que para produzir novos cÃrculos e novas retas, porém, agora, finitos ou infinitos como tais, isto é, que nunca se acabam, pois não têm fim, não têm limites, e não são, portanto, algo absoluto. CÃrculos que se abrem no momento em que se fecham em sua produção e compreensão e retas que seguem em direções opostas em sua produção e compreensão mesmo que apontem numa direção apenas.
CÃrculos e retas que demonstram o erro de Kant em sua crÃtica a si mesmo e de muitos a ele, pois se pensa mais nos limites do conhecimento que ele analisa em sua crÃtica da razão pura, e que o cÃrculo e a reta já produzidos enquanto forma representam, do que nas possibilidades do conhecimento que ele sintetiza em sua crÃtica da razão pura e que os cÃrculos e regras representam ao serem produzidos e compreendidos continuamente sempre de modo diferente ainda que sobre o mesmo traçado, que nunca é o mesmo traçado se se levar em conta aquilo mesmo que fundamenta a crÃtica da razão pura de Kant, isto é, a experiência, neste caso, de produzir sempre novos cÃrculos e novas retas sobre cÃrculos e retas já traçadas, algo que ele soube fazer muito bem e esperava em seu humanismo que cada ser humano aprendesse ao conhecer os limites do seu conhecimento sempre indo além dele, conhecendo algo novo sobre si, o mundo, a vida e de novo sempre.
Eis, enfim, algo que muitos depois de Kant esquecem e não poderiam esquecer se querem saber como fazer uma tese, analÃtica ou sintética, conhecendo os limites de seu próprio conhecimento e buscando sempre ir além dele. Algo que vale não por menos para todos aqueles que manifestam suas opiniões em qualquer momento da vida sobre o que quer que seja.
Não por acaso, a publicação desta obra de Kant foi denominada de revolução copernicana por tudo que produziu em relação à compreensão do conhecimento, porém, esta revolução não lhe diz propriamente respeito, mas começa bem antes dele com Francis Bacon com sua crÃtica aos Ãdolos do teatro e, principalmente, com David Hume em sua crÃtica à tradição racionalista. Mas como toda crÃtica, o alcance da de Kant vai até o onde se propaga a crÃtica de seus detratores, neste caso, os do idealismo alemão representado em sua máxima expressão por Hegel, cujo absolutismo defendido fará a razão pura retornar ao pensamento filosófico pré-kantiano, agora despojada aparentemente de uma metafÃsica religiosa cristã, e a qual servirá para muitos de crÃtica a Kant, que talvez se perguntasse debaixo de seu lençol de terra em paz perpétua: Mas que juÃzos sintéticos Hegel produziu com sua Ideia, seu espÃrito, seu absoluto? Uma pergunta de Kant faria a Hegel e seus crÃticos hegelianos, mas que se pode lançar inevitavelmente a todos aqueles que pretendem conhecer em qualquer área de conhecimento tomando como fundamento a experiência e não a especulação, e aquilo que se coloca como germe nesta experiência e que é o fundamento de toda a modernidade, isto é, o novo.
A crÃtica de Kant no parágrafo em que descreve as possibilidades dos juÃzos analÃticos e sintéticos resume toda sua crÃtica da razão pura e ainda hoje ela ainda pode se colocar não apenas em relação a Hegel, mas também ao se ler livros e artigos acadêmicos, textos que defendem teses de todos aqueles que fazem ou fizeram parte de uma universidade, mas também ao se ler a profusão de comentários em qualquer lugar da Internet no qual se defende uma tese. Não por acaso, o tÃtulo deste texto lembra um outro livro, o de Umberto Eco, uma bÃblia para todos aqueles que procuram fazer suas teses na universidades acreditando ainda numa razão pura ao encher páginas e páginas com referências bibliográficas e citações de autores nos quais não se detieram num mÃnimo de pensamento crÃtico, tal como formulado por Kant no que diz respeito à s duas possibilidades de conhecimento, a analÃtica e a sintética. E muitas vezes propagando sobre a realidade juÃzos analÃticos como se fossem juÃzos sintéticos, isto é, sem acrescentar nada de novo à realidade, ao autor, nem ao conhecimento dela por um autor ou por si mesmos, apenas demonstrando sua razão pura para bancas mais puras ainda em seu conhecimento.
A crÃtica de Kant em relação ao conhecimento a partir das possibilidades do juÃzo analÃtico e sintético é simples como se pode perceber no parágrafo referido em questão. Nele Kant diz:
Em todos os juÃzos em que for pensada a relação de um sujeito com o predicado (...) essa relação é possÃvel de dois modos. Ou o predicado B pertence ao sujeito A como algo contido (ocultamente) nesse conceito A, ou B jaz completamente fora do conceito A, embora esteja em conexão com o mesmo. No primeiro caso, denomino o juÃzo analÃtico, no outro sintético. JuÃzos analÃticos (os afirmativos) são, portanto, aqueles em que a conexão do predicado com o sujeito for pensada por identidade; aqueles, porém, em que essa conexão for pensada sem identidade, devem denominar-se juÃzos sintéticos. Os primeiro poderiam também denominar-se juÃzos de elucidação e os outros juÃzos de ampliação. (KANT, 1996, p. 58)
Talvez muitos se perguntem: que diabo é isso? E a resposta é simples: predicado é tudo que você diz sobre um sujeito, que identifica um sujeito, diz que é o sujeito, ou ainda, tudo que se diz sobre qualquer coisa como em "A casa é amarela." Neste sentido, segundo Kant, se tudo que se diz de um sujeito é algo que ele é, porque ele contém ou possui aquilo, mesmo sem saber, como algo oculto, isto é apenas uma análise que se faz do sujeito, mas que não lhe acrescenta nada de novo. Como no caso da casa amarela quando alguém diz à outra pessoa em frente à casa que a casa é amarela e a pessoa que escuta isto olhando para a casa amarela pensa e diz kantianamente de modo inconsciente: Sim, e daÃ? E daà que isto é um conhecimento analÃtico da casa que nada lhe acrescenta de novo é apenas uma afirmação do que a casa é na realidade e ninguém em sã consciência diante dela negaria isto, mas tão pouco se entusiasmaria também ao ouvir isto ao ponto de dizer: Oh, a casa é amarela! Que maravilha! Eu não sabia! Ou ainda, se perguntar, por que a casa é amarela? Por que pintaram ela de amarela e não rosa, ou não fizeram ela de vidro? De vidro?...
Não há, portanto, nada de novo ao se dizer a casa é amarela diante de uma casa amarela, nenhuma ampliação do conhecimento, pois se sabe o que é uma casa e e que amarelo é uma cor e que juntar o sujeito "casa" com o predicado "amarelo" num juÃzo analÃtico, a casa é amarela, não produz nenhuma ampliação do conhecimento. Portanto, aceitando a crÃtica de Kant e que é uma exigência em defesas na universidade, mas que se pode estender à vida, isto não passa de um conhecimento puro, isto é, em que não há crÃtica alguma nele nem tão pouco suscita uma. CrÃtica que somente é possÃvel quando se faz um juÃzo sintético, como na casa de vidro de Corbisier que muitos poderiam considerar impossÃvel de se pensar quanto mais em morar nela, mas cujo ideia, nem um pouco absoluta, e sim, crÃtica, faz justamente aquilo que Kant pressupôs em relação aos juÃzos sintéticos, que eles ampliem o conhecimento ao ponto de se pensar em relação a uma coisa algo que não se pensaria em relação a ela, como diz Kant criticamente em relação à s duas possibilidades dos juÃzos e do conhecimento ainda no parágrafo em questão:
Com efeito, por meio do predicado aqueles [os juÃzos analÃticos] nada acrescentam ao conceito do sujeito, mas somente o dividem por desmembramento em seus conceitos parciais que já eram (embora confusamente) pensados nele, enquanto os últimos [os juÃzos sintéticos] ao contrário acrescentam ao sujeito um predicado que de modo algum era pensado nele nem poderia ter sido extraÃdo dele por desmembramento algum. (KANT, 1996, p. 58)
Pensar algo que não fora pensado antes, pensar algo que não estava presente antes no que era pensado, pensar algo que não se identifica com aquilo que era pensado antes, eis toda a crÃtica da razão pura de Kant ao conhecimento não apenas a priori a Kant, mas também a posteriori a ele. Pensar deste modo, diz ele claramente na primeira frase depois deste parágrafo, é pensar a partir da experiência, pois, "JuÃzos de experiência como tais são todos sintéticos. (Grifos dele.)" Pensar a partir da experiência, pode-se dizer a partir dele, é pensar a partir de algo novo que é experimentado ou vivenciado naquele momento e que ninguém experimentou ou vivenciou ainda, pois é algo que acontece num determinado espaço e tempo, que se são ainda para Kant condições a priori do entendimento, não por menos o conhecimento não se restringe a estas condições requerendo ele sempre um a posteriori a elas, isto é, conhecer o que acontece na medida em que se experimenta algo no espaço e tempo, algo no caso que não se experimentara antes no espaço e tempo do pensamento ou mesmo da vida. Um conhecimento que falta há muitos hoje em suas experiências de uma vida cotidiana e em suas teses sobre ela sem se preocuparem com a ampliação, seja de sua vida cotidiana, seja de um conhecimento sobre ela em relação a algo novo, não como uma novidade ou moda, mas novo em relação à sua vida que se renova ao experimentar algo que não experimentara antes, ampliando uma compreensão dela para além do que ela é em sua identidade corriqueira.
A devastidão (esta palavra é um neologismo em relação à palavra devastação) que a crÃtica de Kant produz é, deste modo, negativa como ele diz, e tem de ser, pode-se dizer, pois não há crÃtica positiva, a não ser a crÃtica de um juÃzo analÃtico que nada diz de novo sobre algo e é apenas um elogio. Mas se a negatividade da crÃtica kantiana devasta de algum modo um sujeito, tão pouco ela produz uma devastação em relação a ele, isto é, uma destruição absoluta do conhecimento dele como o faz a Ideia de um conhecimento ou espÃrito que o faz considerar o sujeito ele mesmo como absoluto historicamente. Pois o que Kant quer com sua crÃtica é que:
sua utilidade seria realmente apenas negativa com respeito à especulação (grifo meu), servindo não para a ampliação, mas apenas para a purificação da nossa razão e para mantê-la livre de erros, o que já significaria um ganho notável. (1996, p. 65)
De fato, que ganho notável se todos pudessem ser crÃticos em relação ao conhecimento, sabendo até que ponto um conhecimento não passa de especulação de um juÃzo analÃtico doutrinário em vez de ciência de um juÃzo sintético crÃtico que reconhece os limites do conhecimento sobre algo e tenta expandi-lo com algo novo, impensado ainda, promovendo não por menos algo diferente com sua crÃtica, mesmo que isto negue algo pensado em tese antes. Neste sentido, se todos pensassem como Kant que mesmo tendo produzido uma revolução no conhecimento não vê em sua crÃtica nenhuma ampliação, isto é, nenhum juÃzo sintético, nada de novo além do horizonte, mas sabendo que isto era senão útil para ampliar o limite do conhecimento humano sobre si mesmo e sobre tudo para além do que ele próprio imaginaria em seu horizonte. E, deste modo, não caindo no erro como quer Kant que é senão o de muitos que o criticam, que é de pensar que ele pretenda com sua crÃtica ou que sua crÃtica faz é limitar o conhecimento do ponto de vista de sua razão a um sujeito individual em detrimento de um sujeito histórico, quando, pelo contrário, o que faz é elevar o sujeito individual racional ao conhecimento de si mesmo como pura especulação doutrinária andando em cÃrculos ou em retas perfeitas em sua infinitude histórica e fazer com que critique a si mesmo em sua razão individual, quebrando os cÃrculos e retas perfeitas históricas que o aprisionam ad infintinum num absoluto, ainda que para produzir novos cÃrculos e novas retas, porém, agora, finitos ou infinitos como tais, isto é, que nunca se acabam, pois não têm fim, não têm limites, e não são, portanto, algo absoluto. CÃrculos que se abrem no momento em que se fecham em sua produção e compreensão e retas que seguem em direções opostas em sua produção e compreensão mesmo que apontem numa direção apenas.
CÃrculos e retas que demonstram o erro de Kant em sua crÃtica a si mesmo e de muitos a ele, pois se pensa mais nos limites do conhecimento que ele analisa em sua crÃtica da razão pura, e que o cÃrculo e a reta já produzidos enquanto forma representam, do que nas possibilidades do conhecimento que ele sintetiza em sua crÃtica da razão pura e que os cÃrculos e regras representam ao serem produzidos e compreendidos continuamente sempre de modo diferente ainda que sobre o mesmo traçado, que nunca é o mesmo traçado se se levar em conta aquilo mesmo que fundamenta a crÃtica da razão pura de Kant, isto é, a experiência, neste caso, de produzir sempre novos cÃrculos e novas retas sobre cÃrculos e retas já traçadas, algo que ele soube fazer muito bem e esperava em seu humanismo que cada ser humano aprendesse ao conhecer os limites do seu conhecimento sempre indo além dele, conhecendo algo novo sobre si, o mundo, a vida e de novo sempre.
Eis, enfim, algo que muitos depois de Kant esquecem e não poderiam esquecer se querem saber como fazer uma tese, analÃtica ou sintética, conhecendo os limites de seu próprio conhecimento e buscando sempre ir além dele. Algo que vale não por menos para todos aqueles que manifestam suas opiniões em qualquer momento da vida sobre o que quer que seja.
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