Humans
A relação entre seres humanos e máquinas é o que rege a vida em sociedade desde o inÃcio da Idade Moderna. Na série Humans, esta relação é retomada como em muitos filmes de ficção cientÃfica em que a relação entre seres humanos e máquinas emerge em meios a conflitos e paixões desmedidas contra as máquinas ou em favor delas. Mas o que poderia parecer apenas mais uma ficção da inquietação que as máquinas produzem nos seres humanos à medida em que se parecem mais com eles revela-se um questionamento mesmo da nossa própria capacidade de nos conhecermos como seres humanos.
O episódio 1 da primeira temporada de Humans é tudo que se espera de uma ficção cientÃfica que aborde a relação entre seres humanos e máquinas. Amor, ódio, medo, insegurança, indiferença estão ali presentes diante das máquinas que se assemelham em aparência aos seres humanos, mas são, apesar disto, apenas máquinas. A relação entre aparência e essência nunca se revela tão bem quanto na fisionomia humana presente nas máquinas como em Humans que faz surgir o comum pensamento de se elas pensam ou sentem algo tamanha a semelhança que sua aparência tem com o seres humanos. Logo em seguida a este pensamento, porém, se percebendo que por trás de toda a beleza dos sintéticos, como são chamados os robôs na série, o que há é pura mecânica robótica.
Mas resta sempre a dúvida e ela é o maior alimento dos questionamentos, das inseguranças, dos medos, dos anseios, alegrias e tristezas da vida e não consegue ser evitada a cada gesto dos sintéticos na tentativa de descobrir se eles são ou não humanos. Uma dúvida que é constante em filmes de ficção cientÃfica, mas que Humans inverte brilhantemente ao fazer pensarmos não nos humanos que os sintéticos parecem ser, e alguns são, de algum modo, criados para pensarem e sentirem, mas nos humanos que somos. Uma dúvida que é a de sabermos até que ponto nos conhecemos para transformarmos máquinas em nós mesmos.
Descartes já levantaram esta dúvida no alvorecer da modernidade dando a ela todo o contexto filosófico que persiste ainda hoje na relação dos seres humanos com o mundo ao cogitar a si mesmo e ao mundo enquanto máquina. Isto é, que tanto o mundo e a nós mesmos nele não passássemos de uma ilusão criada por nós mesmos enquanto res cogitans para justificar a nossa própria existência. Uma ilusão como a de máquinas que pensam e sentem e podem criar a si mesmas em sua existência e abandonarem aquilo que não lhe é útil a elas, no caso, nós, o que mais se teme na relação entre seres humanos e máquinas e que está presente desde o inÃcio desta série que, de modo brilhante, tem na dúvida seu leitmotiv principal tal como Descartes.
A dúvida é o que nos torna humanos, diria Descartes. Como transformar máquinas em humanos, se pergunta na série, se não nos conhecemos a nós mesmos, em nossas emoções e pensamentos? Eis uma dúvida que parece superada em muitos filmes de ficção cientÃfica em que se acredita piamente que máquinas podem se tornar seres humanos, como no livro O homem bicentenário, de Isaac Asimov, que se tornou filme, e foi o mestre na arte de pôr em dúvida a relação dos seres humanos com as máquinas e é aludido neste primeiro episódio da série para assegurar que máquinas não podem agredir seres humanos e, por isto eles estão seguros.
Que estejamos seguros com as máquinas é tema recorrente em abordagens da relação dos seres humanos com elas e ficamos aliviados de não termos máquinas por perto, de partilharmos apenas com seres humanos em nosso cotidiano e não com toda a tecnologia produzida pela modernidade ainda que tardia. Porém, não estamos seguros com outros seres humanos e este é um problema que não por menos percebemos em séries como esta, pois não são as máquinas os problemas, e sim, nós. Como eliminar a raiva, o medo e outros sentimentos ruins que fazem parte do ser humano e fazem ele ser o que é, pergunta-se na série, uma pergunta que o maior opositor de Descartes no inÃcio da modernidade se colocara em sua Ética, isto é, o filósofo Baruch de Espinosa. Uma pergunta inquietante cuja dúvida de Descartes lutara para se manter distante, pois sabia que poderia ruir seu sistema cartesiano, mas que não deixara de considerar no fim da vida, já que as paixões da alma não podem ser simplesmente descartadas como simplesmente inúteis aos seres humanos.
A relação entre seres humanos e máquinas, e entre os filósofos e as máquinas, principalmente, nunca será amistosa, pois o que ela revela não é a nossa capacidade de nos relacionarmos com as máquinas quando elas se parecem conosco, evitando ou não emoções e sentimentos em relação a elas contra ou a favor. O que a relação entre seres humanos e máquinas em séries como Humans mostra é a nossa incapacidade de nos relacionarmos conosco mesmo que é transposta à s máquinas em amor ou ódio e da qual nunca nos livraremos, a menos que nós nos transformemos em máquinas. E talvez isto seja o que mais se teme quando se depara com um sintético como na série: não é que as máquinas sejam tão parecidas com os seres humanos, mas que os seres humanos venham a ser parecidos com elas, livre de emoções de paixões tristes e alegres, vagando no limbo entre o pensamento e o sentimento, com um olhar vÃtreo que cativa e desespera ao mesmo tempo, por não se saber do que ele seja capaz.
Somos nós refletidos no olhar vÃtreo dos sintéticos que mais tememos, do que se pode fazer quando seres humanos se tornam máquinas que não pensam e não sentem mais o que está em seu redor. É isto que parece mais fascinante nesta série, o temor de nós mesmos refletidos na sÃntese de um ser humano maquÃnico, o que é senão refletido no tÃtulo dela: Humans.
P.S. Para quem quer assistir à primeira temporada, eis o link: http://www.omelhordatelona.biz/humans-1a-temporada-legendado/
O episódio 1 da primeira temporada de Humans é tudo que se espera de uma ficção cientÃfica que aborde a relação entre seres humanos e máquinas. Amor, ódio, medo, insegurança, indiferença estão ali presentes diante das máquinas que se assemelham em aparência aos seres humanos, mas são, apesar disto, apenas máquinas. A relação entre aparência e essência nunca se revela tão bem quanto na fisionomia humana presente nas máquinas como em Humans que faz surgir o comum pensamento de se elas pensam ou sentem algo tamanha a semelhança que sua aparência tem com o seres humanos. Logo em seguida a este pensamento, porém, se percebendo que por trás de toda a beleza dos sintéticos, como são chamados os robôs na série, o que há é pura mecânica robótica.
Mas resta sempre a dúvida e ela é o maior alimento dos questionamentos, das inseguranças, dos medos, dos anseios, alegrias e tristezas da vida e não consegue ser evitada a cada gesto dos sintéticos na tentativa de descobrir se eles são ou não humanos. Uma dúvida que é constante em filmes de ficção cientÃfica, mas que Humans inverte brilhantemente ao fazer pensarmos não nos humanos que os sintéticos parecem ser, e alguns são, de algum modo, criados para pensarem e sentirem, mas nos humanos que somos. Uma dúvida que é a de sabermos até que ponto nos conhecemos para transformarmos máquinas em nós mesmos.
Descartes já levantaram esta dúvida no alvorecer da modernidade dando a ela todo o contexto filosófico que persiste ainda hoje na relação dos seres humanos com o mundo ao cogitar a si mesmo e ao mundo enquanto máquina. Isto é, que tanto o mundo e a nós mesmos nele não passássemos de uma ilusão criada por nós mesmos enquanto res cogitans para justificar a nossa própria existência. Uma ilusão como a de máquinas que pensam e sentem e podem criar a si mesmas em sua existência e abandonarem aquilo que não lhe é útil a elas, no caso, nós, o que mais se teme na relação entre seres humanos e máquinas e que está presente desde o inÃcio desta série que, de modo brilhante, tem na dúvida seu leitmotiv principal tal como Descartes.
A dúvida é o que nos torna humanos, diria Descartes. Como transformar máquinas em humanos, se pergunta na série, se não nos conhecemos a nós mesmos, em nossas emoções e pensamentos? Eis uma dúvida que parece superada em muitos filmes de ficção cientÃfica em que se acredita piamente que máquinas podem se tornar seres humanos, como no livro O homem bicentenário, de Isaac Asimov, que se tornou filme, e foi o mestre na arte de pôr em dúvida a relação dos seres humanos com as máquinas e é aludido neste primeiro episódio da série para assegurar que máquinas não podem agredir seres humanos e, por isto eles estão seguros.
Que estejamos seguros com as máquinas é tema recorrente em abordagens da relação dos seres humanos com elas e ficamos aliviados de não termos máquinas por perto, de partilharmos apenas com seres humanos em nosso cotidiano e não com toda a tecnologia produzida pela modernidade ainda que tardia. Porém, não estamos seguros com outros seres humanos e este é um problema que não por menos percebemos em séries como esta, pois não são as máquinas os problemas, e sim, nós. Como eliminar a raiva, o medo e outros sentimentos ruins que fazem parte do ser humano e fazem ele ser o que é, pergunta-se na série, uma pergunta que o maior opositor de Descartes no inÃcio da modernidade se colocara em sua Ética, isto é, o filósofo Baruch de Espinosa. Uma pergunta inquietante cuja dúvida de Descartes lutara para se manter distante, pois sabia que poderia ruir seu sistema cartesiano, mas que não deixara de considerar no fim da vida, já que as paixões da alma não podem ser simplesmente descartadas como simplesmente inúteis aos seres humanos.
A relação entre seres humanos e máquinas, e entre os filósofos e as máquinas, principalmente, nunca será amistosa, pois o que ela revela não é a nossa capacidade de nos relacionarmos com as máquinas quando elas se parecem conosco, evitando ou não emoções e sentimentos em relação a elas contra ou a favor. O que a relação entre seres humanos e máquinas em séries como Humans mostra é a nossa incapacidade de nos relacionarmos conosco mesmo que é transposta à s máquinas em amor ou ódio e da qual nunca nos livraremos, a menos que nós nos transformemos em máquinas. E talvez isto seja o que mais se teme quando se depara com um sintético como na série: não é que as máquinas sejam tão parecidas com os seres humanos, mas que os seres humanos venham a ser parecidos com elas, livre de emoções de paixões tristes e alegres, vagando no limbo entre o pensamento e o sentimento, com um olhar vÃtreo que cativa e desespera ao mesmo tempo, por não se saber do que ele seja capaz.
Somos nós refletidos no olhar vÃtreo dos sintéticos que mais tememos, do que se pode fazer quando seres humanos se tornam máquinas que não pensam e não sentem mais o que está em seu redor. É isto que parece mais fascinante nesta série, o temor de nós mesmos refletidos na sÃntese de um ser humano maquÃnico, o que é senão refletido no tÃtulo dela: Humans.
P.S. Para quem quer assistir à primeira temporada, eis o link: http://www.omelhordatelona.biz/humans-1a-temporada-legendado/
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