Football: o jogo de uma vida
O futebol americano (football) é um jogo violento, todos sabem disso. Isto pode ser comprovado ainda mais quando assistimos filmes que o retratam e as pancadas que os jogadores sofrem podem ser vistas em câmera lenta e em close-up. O jogo de uma vida (When the game stands tall, 2014), de Thomas Carter, é um destes filmes no qual podemos ver toda a violência deste jogo, mas algo também diferente em relação a ele e toda sua brutalidade.
Não sei nada sobre as regras do futebol americano, mas não é difÃcil perceber a semelhança dele com um campo de batalha, o que o torna menos um esporte do que uma batalha entre times adversários. A demarcação do campo demonstra isto. Sua divisão em jardas demonstra que o palmo de terra é um front de batalha que um time deve transpor e o outro justamente impedir isto. De que modo? Com a força, em geral derrubando o adversário como se estivesse numa luta livre, mas, obviamente, não vale tudo. Há regras bem definidas e o combate é sempre tendo em vista impor ao adversário a sua força, porém, não de modo desproporcional, por mais que isto pareça impossÃvel quando assistimos ao jogo e cada jogada combatida faz-nos tremer os dentes e todo o corpo, imagine nos jogadores.
Semelhante a uma batalha, o futebol americano é o jogo com bola mais estratégico que existe. A formação dos jogadores de ataque e de defesa, perfilados um em frente ao outro, apenas parece a mesma a cada lance do jogo. Encarar o inimigo de frente é uma parte apenas da estratégia. Olho no olho, cada jogador vê seu objetivo sempre à sua frente: passar, não deixar passar. A força bruta é um diferencial, mas não o bastante para impedir o adversário em sua defesa ou ataque. É aà que entra a estratégia e o jogo muda totalmente de aspecto aos olhos, pois quando se pensa que é a força bruta que define o jogo, vemos que não se trata disto, mas do quanto se pode escapar à força do adversário. Os músculos são para impedir num primeiro momento o avanço de um time, mas o que define o jogo é como cada time impõe ao outro sua estratégia particular a cada jogada na tentativa de avançar além da linha inimiga, por cima ou por baixo.
O degladio dos jogadores é brutal, mas é a inteligência de cada um que faz a diferença. A cada jarda, a força bruta dá lugar à esperteza em transpor o adversário, fazê-lo correr atrás de si numa tentativa de derrubá-lo sem sucesso até o touchdown! É o momento em que o jogador ocupa totalmente o território inimigo submetendo-o ao seu poder. Duplo poder, pois, a cada touchdown, um time ainda pode celebrar sua conquista com um chute por entre as traves em forma de Y tão caracterÃsticas deste jogo como sua bola oval, que em nada lembra o futebol de selvagens, ou simplesmente futebol (soccer) e o jogo de cavalheiros como é conhecido o rugbi, ambos originados pelos ingleses.
Ganhar uma jarda no campo de batalha a cada momento deste jogo é uma tarefa árdua no sentido mais literal desta expressão. Um dever, uma obrigação que não é nada fácil, que somente é conseguida com muito esforço, força e inteligência e que, qualquer passo atrás não é uma alternativa para aqueles que o disputam assim como para aqueles que disputam cada batalha numa guerra. Se é assim a cada batalha por jarda, por jogo, o que se dirá então de ganhar 151 jogos consecutivos como conseguiu o time de futebol americano colegial De la Salle High School Spartan representado no filme O jogo de uma vida, uma ficção da vida real?
Com um nome deste, Spartan, talvez se diga que não poderÃamos esperar outra coisa senão um feito histórico como o dos 300 espartanos que retardaram o exército do rei indiano Xerxes. Não por acaso é o lema de guerra espartano ombro a ombro no campo de batalha que o treinador Bob Ladouceur, com sua brandura ("doucer"), tenta lembrar aos jovens jogadores de seu time, bem como o ideal espartano de comunidade e fidelidade aos seus companheiros tão caracterÃstico destes que foram os maiores guerreiros da história antiga e que constituem até hoje o ideal estratégico da guerra através de sua força e inteligência invejável em batalhas.
Mas o que poderia ser um filme sobre como os jovens De la Salle High School Spartan conseguiram suas 151 vitórias consecutivas e como, deste modo, se tornaram um time de futebol americano imbatÃvel durante 12 anos consecutivos (1992-2004) é totalmente deixado de lado em O jogo de uma vida, pois o que é mais importante no filme é a derrota que pôs fim à sequência de vitória deste time colegial invencÃvel em sua época, assim como o que aconteceu com os 300 de Esparta. Mas é justamente isto que faz deste filme tão surpreendente quanto a série de vitórias De la Salle High School Spartan, pois nos faz lembrar que perder é mais difÃcil do que ganhar muitas vezes, ainda mais quando se é jovem e cada perda é sentida como se fosse a última chance de uma conquista durante a vida e da própria vida. E se os espartanos são lembrados até hoje por suas batalhas vencidas, é a que perderam que faz serem lembrados na história.
O que este filme consegue passar a nós a partir do futebol americano e do que ensina o treinador Bob Ladoucer a seus estudantes de modo surpreendente é o exercÃcio constante de se encarar a possibilidade da perda a cada momento à sua frente, quando se está vencendo, mas, principalmente, a perda quando ela acontece de fato, quando o adversário já dominou o seu campo e resistir já não é mais o bastante e, sim, reverter a situação. Neste sentido, um detalhe é importante: não há mudança de lado do campo no futebol americano. Cada lado é milimetricamente igual de modo que nenhum time é beneficiado por ele e se um time tem que reverter a situação em que está não é a partir do fator campo, mas a partir de si mesmo. É o que diz indiretamente o treinador Bob Ladoucer no filme quando De la Salle High School Spartans perde e sua sequência de vitórias é quebrada: "Agora, vamos saber o que este time é capaz de fazer." O que isto só vai ser conseguido na medida em que cada um buscar dentro de si aquilo que produzirá a mudança de todo o time, não apenas dentro de campo, mas fora dele, pois o extra-campo e os dramas que cada um vive em sua vida familiar entram também em campo e decidem muitos jogos ganhos ou perdidos.
É, por sua vez, no modo como encaram a derrota que De la Salle High School Spartan se torna um time vencedor, independente de quantos jogos ganharam, e este filme se torna grandioso. Não por menos, um dos momentos mais importantes do filme que produz uma mudança no time é um momento em que eles encaram a perda em sua forma mais brutal, quando ela acontece no seu próprio corpo, depois de uma batalha. O treinador sabe disso e tenta constantemente lembrá-los que, num campo de batalha, o que importa não é vencer o inimigo, apesar deste ser objetivo. O que importa é quem está ao seu lado e ele faz constantemente seus estudantes perceberem a importância de estarem juntos, de compartilharem a alegria, mas muito mais a tristeza, pois é ela que nos faz fracos na vida. E quando a derrota é iminente, lembra a eles e a si mesmo que se trata apenas de um jogo de futebol colegial e não uma vida, apesar do filme nos lembrar constantemente que é, de fato, de uma vida que se trata. Uma vida que não se joga nas quatro linhas, mas a cada momento em que crescemos, encarando de frente nossos desafios e temores e buscamos vencê-los sempre.
Por tudo isto, O jogo de uma vida é um filme imperdÃvel como era imperdÃvel De la Salle High School Spartan, como deve ser imperdÃvel a própria vida, ainda que sempre a perdamos algum dia.
Não sei nada sobre as regras do futebol americano, mas não é difÃcil perceber a semelhança dele com um campo de batalha, o que o torna menos um esporte do que uma batalha entre times adversários. A demarcação do campo demonstra isto. Sua divisão em jardas demonstra que o palmo de terra é um front de batalha que um time deve transpor e o outro justamente impedir isto. De que modo? Com a força, em geral derrubando o adversário como se estivesse numa luta livre, mas, obviamente, não vale tudo. Há regras bem definidas e o combate é sempre tendo em vista impor ao adversário a sua força, porém, não de modo desproporcional, por mais que isto pareça impossÃvel quando assistimos ao jogo e cada jogada combatida faz-nos tremer os dentes e todo o corpo, imagine nos jogadores.
Semelhante a uma batalha, o futebol americano é o jogo com bola mais estratégico que existe. A formação dos jogadores de ataque e de defesa, perfilados um em frente ao outro, apenas parece a mesma a cada lance do jogo. Encarar o inimigo de frente é uma parte apenas da estratégia. Olho no olho, cada jogador vê seu objetivo sempre à sua frente: passar, não deixar passar. A força bruta é um diferencial, mas não o bastante para impedir o adversário em sua defesa ou ataque. É aà que entra a estratégia e o jogo muda totalmente de aspecto aos olhos, pois quando se pensa que é a força bruta que define o jogo, vemos que não se trata disto, mas do quanto se pode escapar à força do adversário. Os músculos são para impedir num primeiro momento o avanço de um time, mas o que define o jogo é como cada time impõe ao outro sua estratégia particular a cada jogada na tentativa de avançar além da linha inimiga, por cima ou por baixo.
O degladio dos jogadores é brutal, mas é a inteligência de cada um que faz a diferença. A cada jarda, a força bruta dá lugar à esperteza em transpor o adversário, fazê-lo correr atrás de si numa tentativa de derrubá-lo sem sucesso até o touchdown! É o momento em que o jogador ocupa totalmente o território inimigo submetendo-o ao seu poder. Duplo poder, pois, a cada touchdown, um time ainda pode celebrar sua conquista com um chute por entre as traves em forma de Y tão caracterÃsticas deste jogo como sua bola oval, que em nada lembra o futebol de selvagens, ou simplesmente futebol (soccer) e o jogo de cavalheiros como é conhecido o rugbi, ambos originados pelos ingleses.
Ganhar uma jarda no campo de batalha a cada momento deste jogo é uma tarefa árdua no sentido mais literal desta expressão. Um dever, uma obrigação que não é nada fácil, que somente é conseguida com muito esforço, força e inteligência e que, qualquer passo atrás não é uma alternativa para aqueles que o disputam assim como para aqueles que disputam cada batalha numa guerra. Se é assim a cada batalha por jarda, por jogo, o que se dirá então de ganhar 151 jogos consecutivos como conseguiu o time de futebol americano colegial De la Salle High School Spartan representado no filme O jogo de uma vida, uma ficção da vida real?
Com um nome deste, Spartan, talvez se diga que não poderÃamos esperar outra coisa senão um feito histórico como o dos 300 espartanos que retardaram o exército do rei indiano Xerxes. Não por acaso é o lema de guerra espartano ombro a ombro no campo de batalha que o treinador Bob Ladouceur, com sua brandura ("doucer"), tenta lembrar aos jovens jogadores de seu time, bem como o ideal espartano de comunidade e fidelidade aos seus companheiros tão caracterÃstico destes que foram os maiores guerreiros da história antiga e que constituem até hoje o ideal estratégico da guerra através de sua força e inteligência invejável em batalhas.
Mas o que poderia ser um filme sobre como os jovens De la Salle High School Spartan conseguiram suas 151 vitórias consecutivas e como, deste modo, se tornaram um time de futebol americano imbatÃvel durante 12 anos consecutivos (1992-2004) é totalmente deixado de lado em O jogo de uma vida, pois o que é mais importante no filme é a derrota que pôs fim à sequência de vitória deste time colegial invencÃvel em sua época, assim como o que aconteceu com os 300 de Esparta. Mas é justamente isto que faz deste filme tão surpreendente quanto a série de vitórias De la Salle High School Spartan, pois nos faz lembrar que perder é mais difÃcil do que ganhar muitas vezes, ainda mais quando se é jovem e cada perda é sentida como se fosse a última chance de uma conquista durante a vida e da própria vida. E se os espartanos são lembrados até hoje por suas batalhas vencidas, é a que perderam que faz serem lembrados na história.
O que este filme consegue passar a nós a partir do futebol americano e do que ensina o treinador Bob Ladoucer a seus estudantes de modo surpreendente é o exercÃcio constante de se encarar a possibilidade da perda a cada momento à sua frente, quando se está vencendo, mas, principalmente, a perda quando ela acontece de fato, quando o adversário já dominou o seu campo e resistir já não é mais o bastante e, sim, reverter a situação. Neste sentido, um detalhe é importante: não há mudança de lado do campo no futebol americano. Cada lado é milimetricamente igual de modo que nenhum time é beneficiado por ele e se um time tem que reverter a situação em que está não é a partir do fator campo, mas a partir de si mesmo. É o que diz indiretamente o treinador Bob Ladoucer no filme quando De la Salle High School Spartans perde e sua sequência de vitórias é quebrada: "Agora, vamos saber o que este time é capaz de fazer." O que isto só vai ser conseguido na medida em que cada um buscar dentro de si aquilo que produzirá a mudança de todo o time, não apenas dentro de campo, mas fora dele, pois o extra-campo e os dramas que cada um vive em sua vida familiar entram também em campo e decidem muitos jogos ganhos ou perdidos.
É, por sua vez, no modo como encaram a derrota que De la Salle High School Spartan se torna um time vencedor, independente de quantos jogos ganharam, e este filme se torna grandioso. Não por menos, um dos momentos mais importantes do filme que produz uma mudança no time é um momento em que eles encaram a perda em sua forma mais brutal, quando ela acontece no seu próprio corpo, depois de uma batalha. O treinador sabe disso e tenta constantemente lembrá-los que, num campo de batalha, o que importa não é vencer o inimigo, apesar deste ser objetivo. O que importa é quem está ao seu lado e ele faz constantemente seus estudantes perceberem a importância de estarem juntos, de compartilharem a alegria, mas muito mais a tristeza, pois é ela que nos faz fracos na vida. E quando a derrota é iminente, lembra a eles e a si mesmo que se trata apenas de um jogo de futebol colegial e não uma vida, apesar do filme nos lembrar constantemente que é, de fato, de uma vida que se trata. Uma vida que não se joga nas quatro linhas, mas a cada momento em que crescemos, encarando de frente nossos desafios e temores e buscamos vencê-los sempre.
Por tudo isto, O jogo de uma vida é um filme imperdÃvel como era imperdÃvel De la Salle High School Spartan, como deve ser imperdÃvel a própria vida, ainda que sempre a perdamos algum dia.
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