A banalidade do mal em plena praça pública

A banalidade do mal é um tema ao qual se dedicou Hannah Arendt sobremaneira, muito bem representado no caso de Eichmann recentemente transformado no filme Hannah Arendt e demonstrado pela reportagem sobre um corpo estendido em praça pública ao qual as pessoas não dão a mínima atenção noticiado na reportagem A cerveja, o tira-gosto e um corpo, de Fábio Campos.

Sobre esta banalidade do mal e a indiferença das pessoas diante da morte de alguém, a seguinte passagem sobre a filosofia de Heidegger nos faz pensar um pouco sobre esta situação:
O "ser-aí" é um "ser-para-a-morte". A máxima "situação-limite", que é a morte, ao aparecer no cotidiano, possibilita-lhe o olhar crítico sobre sua existência. É característica da inautenticidade abordar a morte como "morte na terceira pessoa", ou seja, a morte dos
outros, evitando tematizar a própria finitude e, portanto, nunca questionando a própria existência. (ARANHA e MARTINS, 2009, p. 259)

Ver a morte na terceira pessoa é, podemos dizer, o que demonstra a banalidade do mal como diz Hannah Arendt, pois o mal mais extremo é causado não por pessoas "diabólicas" ou "maldosas por natureza", e sim, por pessoas comuns que não veem a morte como algo que lhe diga respeito. Pessoas burocráticas como o nazista Eichmann que, mesmo diante da morte de milhares de pessoas no holocausto que ele ajudara conduzindo-as aos trens que as levavam à morte, simplesmente considerava que estava obedecendo ordens, sem nenhuma reflexão sobre os acontecimentos, sobre suas ações, tal como também cumpria ordens o piloto de avião que jogou as bombas em Hiroshima e tantos outros militares, torturadores da ditadura, e todos os que estavam na praça, apenas cumprindo a ordem de se divertir, de não se preocupar com nada que não seja em relação a eles mesmos, proliferando a violência do mal que muitos não vêm a não ser quando bate em sua porta sem avisar, como é costume da morte.

Parece que, neste sentido, vivemos cada vez mais na inautenticidade de que trata Heidegger como diz Aranha e Martins, pois:
O indivíduo inautêntico é o que se degrada vivendo de acordo com verdades e normas dadas; a despersonalização o faz mergulhar no anonimato, que anula qualquer originalidade. É o que Heidegger chama mundo do "se", ao designar a impessoalidade
da ação: come-se, bebe-se, vive-se, como todos comem, bebem, vivem. (ARANHA e MARTINS, 2009, p. 259)
Diante disso é mais do que necessário nos preocuparmos com aquilo que Heidegger chama de autenticidade do ser-aí, isto é, um ser que se projeta no tempo, por este projetar entendendo-se modificar no tempo antes que a banalidade do mal nos modifique completamente

Trailer do filme "Hannah Arendt".

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